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quarta-feira, 28 de novembro de 2012

A VOLTA DE FELIPÂO

Por Matheus Pichonelli (Carta Capital)

O atacante Luan, do Palmeiras, tem provavelmente o pior aproveitamento do Campeonato Brasileiro entre os jogadores da posição. Ele não faz gol, não cabeceia, não sabe cruzar, não acerta passe (a não ser quando erra), vive sendo expulso por bobagem. 

Mas marca e corre o jogo todo e, assim, se tornou um dos talismãs de Luiz Felipe Scolari em sua segunda passagem pelo Palmeiras – aquela em que levou o clube ao seu primeiro título nacional da era pós-Parmalat (sim, fazia tempo) e, ao mesmo tempo, abriu um buraco para o rebaixamento poucas semanas depois.
Luiz Felipe Scolari durante treino na Copa em 2002.
É possível que os vizinhos de Luan tenham ouvido um grito de alegria quando foi confirmado o retorno do treinador à seleção brasileira, exatos dez anos depois da conquista do penta na Copa do Japão e da Coreia.
Havia, inclusive, alguns Luans naquele time vitorioso: Belletti, Kleberson, Anderson Polga…Tinha tudo para ser uma tragédia. Deu no que deu.
Quem já teve o time treinado por Felipão e seu fiel escudeiro, Flávio Murtosa, sabe o que é viver na era dos extremos. Os fãs dirão sempre que a Copa de 2002 foi vencida graças ao treinador, que instituiu a família Scolari, apostou em nomes de sua confiança, fez pouco caso de Romário e botou a máquina para funcionar. Outros dirão que a Copa foi vencida apesar dele. E que os méritos são todos de Rivaldo e Ronaldo, os dois últimos gênios do futebol brasileiro.
No que os fãs revidariam: com Oseas e Paulo Nunes, ele foi campeão do mesmo jeito.
Não deixa de ser verdade.
 
Como é verdade também que, desde a Copa de 2002, Felipão deixou de fazer jus, muitas vezes, ao título de super-treinador, obtido com mérito graças às conquistas dos times sob seu comando, sobretudo a partir dos anos 1990 (três Copas do Brasil, um Brasileiro, duas Libertadores e, claro, a Copa do Mundo). Desde então, o máximo que conseguiu foi levar a seleção de Portugal a uma final de Eurocopa e às semifinais da Copa de 2006. Não é pouco, dirão os fãs. Mas perdeu para a Grécia (a Grécia!) uma final ganha, dirão os detratores.
Felipão deixou o Palmeiras em baixa quando a queda para a Série B parecia inevitável. Os torcedores que o adoram dirão sempre que ele fez o que pôde e, se tivesse um elenco melhor, seria campeão brasileiro, da Libertadores, do Mundial de Clubes e da Recopa em Marte. Os desconfiados dirão que ele foi embora tarde. Que a responsabilidade por escalar o time (e afastar atletas como o atacante Kleber) era dele e lembrarão sopapos homéricos, como os 6 a 0 para o Coritiba e as surras para os maiores rivais (perdeu a maioria dos confrontos para Corinthians e São Paulo).
Goste-se ou não, um velho jeito de jogar futebol parece a caminho da seleção. 

Sem Mano Menezes, o time ganha carisma, é fato, mas pode sofrer com a volta de velhos Luans (ou a estreia do atacante palmeirense que dá nome ao adjetivo). As dúvidas são muitas. Jogaremos com oito volantes? Marcos Assunção será o camisa dez? O esquema vai ser “bola na área e salve-se-quem-puder”? Resgataremos o 9-0-1?
Em 2002 não foi assim. O time aprendeu a colocar a bola no chão e levou o título de forma invicta, batendo times como a Inglaterra e a Alemanha. (“Roubaram a Bélgica nas oitavas, a Inglaterra era um lixo e a Alemanha jogou sem o Ballack!”, gritam aqui os pessimistas).
Felipão volta à seleção, portanto, da mesma forma que a encontrou pela primeira vez: sem unanimidade. Pode ser um tira-teima. Agora não haverá Ronaldo nem Rivaldo. Neymar vai desencantar? Kaká será capaz de liderar o time? Ganso vai ganhar chance? A zaga vai funcionar?
As dúvidas são muitas, mas uma coisa parece certa. Felipão é o nome certo para torneios de tiro-curto. Estrela ele tem. Currículo também. Só que a mesma estrela e o mesmo currículo andam meio apagados pelo tempo. 

Com ele – e o provável coordenador técnico Carlos Alberto Parreira – de volta, a seleção brasileira será a equipe com mais cara de anos 1990 entre os rivais, que se inovaram, se reciclaram e se tornaram mais competitivos. Isso é ruim? Talvez não. Mas é bom lembrar: em 1994, o competitivo Grêmio de Felipão e Jardel era capaz de bater a Espanha de Javier Clemente e Luis Enrique. Hoje todo time de Felipão é uma versão atualizada daquele Grêmio vitorioso, mesmo sem a letalidade dos velhos tempos. A Espanha de Xavi e Del Bosque, por sua vez, é nem sombra daquela escola. Não por acaso, é a atual bicampeã europeia e campeã do mundo.
Nem sempre talento ganha jogo, diz o chavão, e é justamente a falta de talento que tem tirado, nos últimos anos, o brilho da seleção – e não apenas os eventuais erros de treinadores como Mano Menezes e Dunga.
Felipão terá um ano e meio para recuperar esse brilho duplo, dele e da seleção. E só o título dirá como ele será lembrado a partir de agora: se como o salvador que fez dois raios cair num mesmo lugar ou se como o homem que ofuscou a própria história conquistada 12 anos antes. É um desafio arriscado. Mas desafio não é para fracos. E fraco Felipão já mostrou que não é.

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